Overland Amaral alerta que Sergipe não está livre de sofrer com grandes catástrofes climáticas

Por Habacuque Villacorte – Da Equipe Cinform On Line

Diante das discussões intensas a respeito das mudanças climáticas, que já resultaram em quase 300 pessoas mortas ou desaparecidas após a recente enchente histórica no Estado do Rio Grande do Sul, e possíveis consequências que possam ser sentidas pela sociedade de agora em diante, a reportagem do Cinform On Line procurou aquele que, por anos, se consolidou como a maior autoridade para comentar o assunto em Sergipe: Overland Amaral, gerente de Meteorologia e Mudanças Climáticas do Departamento de Recursos Hídricos da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Sustentabilidade e Ações Climáticas. Ele também faz alertas para o clima em Sergipe, Confira a seguir, e na integra, esta entrevista exclusiva:

CINFORM ON LINE: Iniciando a entrevista, vamos à pergunta que não quer calar: o incidente que está acontecendo no Rio Grande do Sul é um fenômeno da natureza ou daria para ser evitado pelo homem?

OVERLAND AMARAL: Trata-se de um fenômeno da natureza extremo, decorrente das mudanças climáticas e do processo atmosférico, que nós costumamos chamar de “ciclonagem”, onde o vapor da Amazônia desce (rios voadores) e seguem para a região Sudeste. Caso eles não existissem, aquela área seria um deserto! Em cima do Paraguai tem uma baixa pressão, é uma espécie de zona de convergência que recebe todos os ventos carregados de umidade e leva para a atmosfera. Neste momento em que a frente se encontra aí temos chuvas intensas que vão continuar ocorrendo, e não apenas lá, mas em todas outras regiões.

CINFORM ON LINE: Como pesquisador e especialista no assunto, o senhor poderia citar alguns outros exemplos de regiões que sofrem com este tipo de enchente, semelhante ao que está ocorrendo no Rio Grande do Sul?

OVERLAND AMARAL: Temos como exemplos Portugal, Dubai…lá no meio do deserto e surgiram grandes ciclones! Isso porque você tem uma área que absorve muito calor por conta dos prédios e pavimentações, mas tem a umidade que por ali, formando uma zona de baixa pressão com redemoinhos. E depois vem as chuvas. Na China foi a mesma coisa! Isso vai acontecer cada vez mais no globo terrestre por conta do excesso de energia armazenada pelo dióxido de carbono. É uma área de forte instabilidade.

CINFORM ON LINE: Mas e quanto às chuvas em Sergipe? Há risco de mais instabilidades?

OVERLAND AMARAL: Eu vivo estudando isso a vida inteira! É a paixão da minha vida! A costa sergipana é baixa e se assemelha a da Holanda, Dinamarca e Filipinas. As duas primeiras têm fenômenos piores do que acontece aqui. Estão sujeitas a chuvas fortes. A gente diz que a maré alta bloqueia a frenagem, mas tivemos registros de muitas chuvas fortes em tão pouco tempo. E temos o risco de termos catástrofes ainda maiores em Sergipe porque não temos escoamento! Maio é o mês mais chuvoso, tradicionalmente. Em média chove 320 mm; nos anos chuvosos esta média pode chegar em 500 mm. Ainda temos muita chuva para cair em Maio. Entramos no La Niña que é um fenômeno que pode vim acompanhado de chuvas até setembro ou outubro. Para a Agricultura pode ser positivo e pode resultar em até mais de uma safra; também pode ser bom para as regiões que fazem armazenamento de água.

CINFORM ON LINE: Mas diante desta situação, o que poderia ser feito pelo menos para amenizar o sofrimento das pessoas?

OVERLAND AMARAL: Na Holanda eles avançaram na busca por soluções. Eles estruturaram as microbacias canalizando para a veia principal, para temporalizar a água até o mar. Desde então não tiveram mais registros de desastres como anteriormente. Não é só desentupir bueiros e canais. Isso contribui, é verdade, mas não resolve o problema! Tem que ter o planejamento para as microbacias que canalizam a estrutura. É uma equação simples! Isso é engenharia, é estudo e trabalho. Veja o que acontece toda as vezes na 13 de Julho quando a maré está cheia! O Estado tem que fazer o seu papel, o Município tem que fazer o seu papel! É preciso defender o cidadão porque não tem dinheiro nesse mundo que pague uma vida! E nós pagamos impostos para isso! Esses fenômenos da natureza vão continuar acontecendo e nós temos que estudar e nos organizar para aprender a conviver com eles.

CINFORM ON LINE: Pelo seu conhecimento técnico da área, aqui em Sergipe nós temos estrutura suficiente para se for o caso, atravessar um fenômeno como essas enchentes, por exemplo?

OVERLAND AMARAL: Cito para você um simples exemplo: a barragem de São Cristóvão. Aquela área tem que ser estudada e monitorada com frequência, todos os dias, em regime de plantão mesmo! Tem que verificar se tá tudo normal! Isso é defender o cidadão! Preciso destacar um grande sergipano que foi João Alves Filho (in memoriam). Um homem público que teve a grande ideia de fazer as barragens na região Agreste. Ligando um eixo norte ao eixo sul! Até hoje aquela região não sofreu sem água por conta dessas barragens. Caso contrário, hoje em dia, não teríamos mais população nessas regiões porque faltaria produção de água. E a nossa sorte é que essas barragens carregam rapidamente! João Alves é um exemplo da boa engenharia! É o que precisamos nos tempos atuais, de novas estruturas que nos ajudem a conviver com esses fenômenos.   

CINFORM ON LINE: Pelo o que o senhor explica, então serão cada vez mais comuns estes fenômenos da natureza. Há o que fazer no Rio Grande do Sul por enquanto ou o jeito é esperar a água das enchentes baixar?

OVERLAND AMARAL: No momento as autoridades devem esperar e se preparar para a reestruturação completa. É recomeçar uma outra vida. Os gaúchos estão passando por uma fase de destruição de guerra. Vai ser preciso inteligência e muita capacidade para se reerguer. Ninguém esperava o que infelizmente aconteceu. Agora é pensar na construção de uma estrutura de defesa para manter a população em condições de trabalho, de produtividade. O que aconteceu no Rio Grande do Sul pode ocorrer em outras cidades do País, como aconteceu em Brumadinho (MG), por exemplo.

CINFORM ON LINE: Concluindo a entrevista, para se chegar a uma reconstrução tão grande é preciso uma somação de forças muito grande, ou não?

OVERLAND AMARAL: Todos os setores devem estar envolvidos no acompanhamento de tudo que envolve o clima. Isso vai desde a estrutura das construções, de atividades ligadas à engenharia civil, como também para a agricultura. É necessária a participação de todos. Há quem diga que áreas em Sergipe podem desaparecer. Eu quero saber qual o antecedente? Que estudos foram feitos? Qual a medida? Qual a intensidade? Agora a população precisa acordar! Os carros elétricos representam avanços, mas eles são caros! Agora é preciso também verificar a produção de eletricidade para carregar esses veículos. Tem que ser uma relação sadia com a natureza. Nós dependemos dela e temos que ter a melhor relação para que ela não se acabe!

FRASES

“temos o risco de termos catástrofes ainda maiores em Sergipe porque não temos escoamento!”

“Os gaúchos estão passando por uma fase de destruição de guerra”

“Todos os setores devem estar envolvidos no acompanhamento de tudo que envolve o clima”

“João Alves Filho teve a grande ideia de fazer as barragens na região Agreste”

“Entramos no La Niña que é um fenômeno que pode vim acompanhado de chuvas até setembro ou outubro”

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