Como os interesses pontuais de Emannuel Macron e a deselegância de Bolsonaro desencadearam um lamentável abalo político na diplomacia Brasil – França
Edvar Freire Caetano – da redação
Emannuel Macron conseguiu uma brilhante e inesperada vitória para a presidência da França, sobrepujando nomes muito mais tradicionais no universo político do seu país. Às voltas com reformas trabalhistas contrárias à sua pregação de campanha, coisa que nós, brasileiros, conhecemos muito bem, amargava uma rejeição extremamente incômoda, com apenas 31% dos franceses ainda lhe concedendo crédito.
Movimentos de sindicatos fortes, como o dos ferroviários, levaram mais de 500.000 pessoas às ruas de várias cidades da França, além de sindicatos de servidores públicos agravados com a decisão “macroniana” de extinguir 120.000 empregos no setor. No meio da confusão generalizada, os temidos camisas-amarelas impuseram um clima de terror em meio a uma população descontente e um aparato policial atônito.
Como se não bastasse, há ainda o caso dos imigrantes, que se utilizam do acesso pelo Mar Mediterrâneo para aportarem na Europa Ocidental em busca de acolhimento, o que torna complicada a posição do presidente da França na decisão de receber ou não receber, ou sob que circunstâncias tomar decisões tão polêmicas.
De acordo com a organização Ifop-Fiducial, em levantamento publicado no início de agosto, pela revista Paris Match e pela emissora Sud Radio, a porcentagem de satisfeitos com Macron caiu dez pontos porcentuais neste verão.
Macron, meio perdido, precisava de algo que ressuscitasse sua imagem apagada perante a França e, mais que tudo, perante a opinião pública na União Europeia e no mundo. Os incêndios temporais e as queimadas criminosas, que acontecem há décadas na Amazônia, como acontecem nos Estados Unidos, na França, em Portugal e em qualquer país do mundo, vieram ao encontro do oportunismo do presidente francês.
O embate carreirista do acordo comercial –Servindo-se da guerra particular entre parte da grande mídia e o governo no Brasil, bem como da exploração psicológica de ampla parcela da população brasileira, que não se contenta com a perda de poder dos partidos alinhados à esquerda, Macron apelou para sentimentos difusos globais, como a defesa do meio ambiente, que é uma bandeira de todos, para conquistar um lugar de destaque no arcabouço do G7 ¬ grupo dos sete países mais ricos do mundo.
Partindo dessa premissa, o homem pretendeu um protagonismo que outros presidentes da França conquistaram, mas que ele está muito distante disso, defendendo o inverossímil princípio de universalização da Amazônia, ameaçando a soberania nacional e o direito do Brasil ao seu território, alegando coisas que a ciência já descartou, como aquela que diz ser a Amazônia o pulmão do mundo.
Para começar sua diatribe, Macron, em estampa impávida, alimenta a mídia mundial taxando de mentiroso o presidente da República Federativa do Brasil, uma nação independente, como todas deveriam ser, embasando-se em conversas privadas que teria mantido com o imprudente Jair Bolsonaro. Imprudente porque fala, às vezes ¬ muitas vezes ¬ sem pensar.
No meio desse circo, destaca-se a insatisfação dos produtores rurais franceses (e europeus) com a iminência da entrada do Mercosul na União Europeia, essencialmente do Brasil, com sua extraordinária capacidade de produção de bens alimentícios, expandida com modernas técnicas de exploração, diante da escassez mundial e da falta de novas fronteira agrícolas na Europa.
Ameaçando o recente acordo, ainda em fase de conclusão, Macron pretendia ganhar alguns apoios de seus pares, o que ainda não parece estar acontecendo porque muitos estadistas percebem claramente os objetivos, nem tão escondidos assim, de Emannuel.
Interesses difusos globais e fakes news –Assim que Macron detonou Bolsonaro, mundialmente, surgem manifestações dos quatro cantos do planeta denunciando o governo do Brasil e defendendo a Amazônia, todos alinhados com ONGs internacionais, afirmando que a floresta tropical da América do Sul pertence ao mundo. Tudo isso com muitos brasileiros compartilhando tolices como essas nas onipresentes redes sociais.
Para defender seu discurso de criar um “estatuto para a Amazônia”, com sua “necessária internacionalização”, Macron, de forma incauta, utilizou uma foto bem antiga, como se fosse atual, que foi feita pelo fotógrafo Loren McIntyre, que morreu em 2003. Ele esteve na Amazônia em expedições desde a década de 70, quando trabalhou para a National Geographic.
Outras postagens veiculadas, segundo o portal G1 #Fato ou #Fake, mostram que: a imagem do coelho com pelos queimados foi feita em um incêndio que ocorreu na Califórnia, nos Estados Unidos, em 2018. Ou seja, não tem nenhuma relação com o Brasil. Já a imagem do animal correndo em meio a um campo em chamas foi feita durante queimada de canavial em Sertãozinho, no interior de São Paulo, em 2011, registrada pelo jornal “Folha de S. Paulo”. O tatu foi encontrado em um canavial em Araras, no interior de São Paulo, em 2018. Ele foi atendido e internado em um centro de reabilitação. Por último, a imagem do animal caído foi feita em Presidente Venceslau, também no interior de São Paulo, em 2011, e está relacionada a uma notícia sobre queima de palha de cana-de-açúcar.
Um vídeo compartilhado no Instagram, por celebridades de Hollywood, mostra uma mulher indígena chorando enquanto aponta para as chamas e promete protesto contra os criminosos que atearam fogo em sua aldeia. O título fala em incêndio na Floresta Amazônica. O vídeo, na verdade, retrata uma mulher indígena da tribo Naô Xohâ da região metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais.
Então, aparece a tal postagem –No meio do enrosco, surge nova oportunidade para Macron atacar Bolsonaro, e aí entram as notórias primeiras-damas e a imprudência de Jair no trato com as fatídicas mídias sociais. Espertamente, surge Emannuel, aproveitando-se da crença mundial, equivocada, de que “a mulher é sexo frágil” e carece de proteção especial, quando, na verdade, ela precisa daquilo que lhe é devido: respeito.
Brigitte Marie-Claude Macron é uma professora francesa, uma mulher elegante, assim como a primeira-dama do Brasil, Michele Bolsonaro, que é uma ativista de causas sociais há muitos anos e professora de LIBRAS (Linguagem Brasileira de Sinais).
Um seguidor do presidente brasileiro nas mídias sociais veiculou uma mensagem maldosa, comparando as duas distintas primeiras-damas e alegando que a diferença entre elas é que irritava o presidente francês, ao que Bolsonaro ¬ o imprudente ¬ postou a malsinada expressão “Rodrigo Andreaça não humilha cara. kkkkk”.
Isso poderia não passar de uma brincadeira ¬ de mau gosto, é claro ¬ se não envolvesse o casal que ocupa a suprema magistratura de um país soberano, ainda mais com um histórico de estreita parceria com o Brasil em todos os campos, que vão da cultura até a tecnologia de ponta.
Foi o suficiente para uma sequência de quebra de protocolos tradicionais, o que poderia ser evitado com um mínimo de diplomacia, já que o Brasil é um país pacífico e que respeita acordos, contratos e costumes internacionais.
Macron também deixa muito a desejar nesse campo, porque ele iniciou todo esse abalo e porque parece não conhecer o Brasil suficientemente para querer tratá-lo como uma coloniazinha qualquer, em que pesem os tropeços de Bolsonaro.
Sem qualquer direito de ingerência nas coisas do Brasil, foi inadequada sua pretensão ao afirmar “esperar que os brasileiros tenham rapidamente um presidente à altura do cargo”, mesmo sendo essa a opinião de muitos patrícios do lado de cá.
Foto: originalmente publicada no Portal UOL