Era Julho de 1981, estava eu sentado nas arquibancadas do ginásio Constâncio Vieira esperando minha vez de ensaiar a canção Vôo Livre que classificamos no FSMPB – Festival Sergipano de Música Popular Brasileira, produzido pela TV Sergipe que realizou duas edições, em 1981 e em 1982. O Festival tinha sido pensado por Mozart Santos superintendente da época, Jorge Carlos Gomes, Brayner entre outros. Bem no estilo dos festivais realizados pela TV Globo a TV Sergipe realiza o festival nas comemorações do aniversário da emissora.

 

A espera estava ficando chata, pois toda estrutura estava atrasada, o som os técnicos não se achavam, pois o ginásio é muito ruim de acústica e já tinha me chateado demais com tudo aquilo. Então, afastei-me um pouco e fiquei lá sentado tentando me concentrar. De repente ouvir uma voz forte danada, muita afinada e bem nordestina cantado: Quando a faca peixeira se agita, pelo som do baião. Na barriga é cada nó na tripa, e não bate o pilão… Fé ó José. Mostra a ferida pra vida, Fé ó José, homem não se intimida…  A música chamou minha atenção pois já tinha ouvido aquela voz em algum lugar, perguntei ao Jorge Lins que estava próximo de mim, que era o cantor? Ele respondeu: É Antônio Carlos o cantor do Bolo de Feira.

 

Já tinha ouvido cantar no compacto duplo que o grupo gravou em 1980 um ano antes do Festival, a capa era genial do artista sergipano Alberto Alcosa um gênio do nanquim e da publicidade. O disco com quatro canções: Minha morena (Antônio Carlos), Muié rendeira (Domínio popular), Nordeste modernizado (Beneti Nascimento) e Bolo de feira (Antônio Carlos), fora gravado em Recife nos estúdios Rozenblit hoje Somax, o grupo tinha uma puxada nordestina e moderna bem ao estilo do quinteto violado.

 

O Grupo formado nos anos 70 tinha, Benete Nascimento na flauta, Mica na Sanfona, Zezinho na Viola, Maroaldo na Zabumba, depois entraram Jairo Bala no baixo e Ademir Baçu na Bateria além do cantor e violonista Antônio Carlos. O grupo gravou dois compactos duplos no segundo foi gravado a música que sempre é lembrada por todos “Meu Papagaio”. Meu papagaio das asas douradas quem tem namorada brinca meu papagaio, quem não tem fica sem nada meu papagaio. Quando Antônio Carlos sai do grupo para fazer carreira solo entrou no lugar o baiano Juça, bom musico e ótimo cantor, ficou até o fim do grupo nos anos 80.

 

Gostava muito do trabalho do grupo, mas não conhecia o Antônio e estava vendo pela primeira vez ao vivo e sendo meu concorrente e um forte concorrente. Nesse Festival Antônio Carlos ganhou o terceiro lugar com sua música Fé é José e em quinto como interprete com a canção Caminhante de Nazivan Cardoso. Caminhante eu sou nestas terras do meu país, Caminhante eu vou nestas terras do meu Brasis…

 

Antônio Carlos dos Santos nasceu em Porto da Folha, no povoado Lagoa Cumprida no sertão de Sergipe, em 1952, um buraqueiro de alta estipe, o menino Antônio Carlos herdou dos seus ancestrais a força da luta e a vontade de viver sempre melhor, seu avô materno era tocador de cavaquinho e seu avô paterno era mestre da banda de pífano e do samba de coco, sua mãe cantava na beira do riacho Capivara lavando e enxaguando as roupas. Nessa ambiente musical e cultural o menino adorava suas raízes e gostava de brincar de vaqueiro e de padre, adorava rezar uma missa.

 

Antônio Carlos começa a cantar com seus pais e avós depois no coro da igreja e no cine Guarani, era conhecido por Carrinho de Afonso e ganhou muitos prêmios. Em 1961, Antônio tem uma mudada radical de vida ele conhece Dom José Brandão de Castro bispo de Propriá, o bispo ficou impressionado com o menino que “furtava” água dos carros-pipa para saciar a sede dos carneiros pois a seca era medonha e assim os carneiros era só avistar o menino que saiam todos atrás dele, era a versão de São Francisco de Assis do nordeste e assim ele ficou conhecido como Santo Antônio dos Carneirinhos. Antônio foi seminarista a convite de Dom José em Propriá e depois no seminário Arquidiocesano, em Aracaju, com o Conego Carvalho sem nunca deixar de cantar.

 

As dificuldades econômicas e de saúde da família fazem com que o menino deixe o seminário e busque condições financeiras para ajudar. Ele começa a cantar em bandas como “Vikings”, “Embalo D”, Gerusa e seus Big Loys e na “Orquestra do Maestro Medeiros” como cronner, cantava de tudo até em inglês um dos seus ídolos era o Elvis Presley. Em 1970, o jovem Antônio, agora com 20 anos, entra na Petrobras e fica até 1997, sem nenhum momento deixar a música de lado e sua preocupação de divulgar e expandir a música sergipana e nordestina.

 

Com o seu primeiro compacto duplo nasce o Antônio Carlos du Aracaju e sua música Pássaro em parceria com Jorge Lins, que dá nome ao disco, foi um grande sucesso alcançando os primeiros lugares em todas as rádios de Sergipe e além fronteiras.

 

O segundo disco leva seu nome Antônio Carlos du Aracaju lançado oficialmente em 1986 pela gravadora FamaSom, com produção de Antônio Poderoso e arranjos do mestre Oswaldinho do Acordeon. Todas as faixas são de autoria do próprio Antônio Carlos Du Aracajú, além da readaptação da música de domínio público “Meu Papagaio”, típica do folclore sergipano, com algumas adaptações do próprio Antônio e que ele já tinha gravado no segundo compacto do Bolo de Feira. Duas músicas se destacaram no disco “Natureza Feminina” e “Sergipe Meu Amor”.

Antônio Carlos já gravou mais de 80 canções em projetos e álbuns como: Antônio Carlos du Aracaju, Preto no Branco, Vida de Gado, Festa de Rua entre outros e tem em fase conclusiva três livros de sua autoria: Tauromaquia, Textos Reticentes, Es­padela e Paredes & Pontes.

 

Antônio Carlos du Aracaju esse versátil cantou, compositor, músico, arranjador, diretor musical, jornalista e escritor. É membro do Movimento de Apoio Cultural da Academia Sergi­pana de Letras (MAC), recebeu comendas e medalhas, mas seu maior legado é a luta constante em defesa da nossa música e da nossa cultura e ele adora tudo isso. Encontrei Antônio Carlos em diversos shows e palcos e todos brincavam e diziam: – Temos que fazer nosso shows antes do Tonho, pois ele quando sobe no palco não quer sai mais.  Pois esse é o lugar que ele mais ama ficar cantando suas verdades e suas raízes, sempre acompanho do seu anjo da guarda Cidinha do Aracaju, cantora, vocalista e seu braço direito.

 

Uma vez vinha eu do Rio de Janeiro e quando entrei no avião lá estava ele sentado com um toca fitas nas mãos e um fone no ouvido, escutando algo bom e divertido, estava de olhos fechados com o rosto feliz e sorrindo, nem viu que sentei ao seu lado, deixei ele a vontade e não interrompi e assim o avião levantou voo.

 

Em determinado momento acho que a fita acabou e ele abriu os olhos e me viu, fez uma festa danada e disse que já estava a mais de 15 dias gravando seu disco em São Paulo e já foi logo passando o fone e pedindo para que eu ouvisse. Disse que estava muito feliz com o resultado, as músicas ficaram todas boas, falou dos arranjos, dos músicos do estúdio, uma felicidade só. Fiquei feliz com aquele amor e dedicação ao próprio trabalho e minha admiração por ele só aumentou.

 

Antônio Carlos du Aracaju é de Porto da Folha, de Sergipe, do Brasil e do mundo, um homem grande em corpo e alma e por isso tenho Fé, é José.

 

 

 

 

 

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