
Cansaço físico e mental, estresse e depressão, estes são alguns dos problemas enfrentados por uma boa parte dos profissionais de saúde em Sergipe durante a pandemia. Esse quadro de adoecimento de homens e mulheres, impotentes diante de tantas mortes e lotação de hospitais provocadas pela Covid-19, tem preocupado o Sindicato dos Médicos (Sindimed), que pede atendimento psicológico imediato, inclusive para os que foram sequelados pela doença.
De acordo com o presidente do Sindimed, Dr Helton Monteiro, inúmeros fatores levaram a este momento de angústia e desânimo por parte dos profissionais de saúde. Um deles é a precarização do contrato de trabalho. No quadro de pessoal existem médicos estatutários, concursados, celetistas, mas também contratados pela Fundação Hospitalar de Saúde (FHS), médicos que atuam como Recibo de Pagamento Autônomo (RPA), Pessoa Jurídica (PJ) e agora contratados via credenciamento.
“O Sindimed já havia denunciado estas formas de contratações, que não geram vínculo, autonomia e nem estabilidade para os profissionais. No início da pandemia, justamente preocupado com esse tipo de precarização, nós lutamos junto à Secretaria de Estado da Saúde e conseguimos que o profissional atuante na linha de frente tivesse o direito a receber pelo tempo de adoecimento. Já foi uma grande conquista”, disse Dr Helton.
Segundo ele, essas condições, como a impossibilidade de gerar vínculo empregatício, têm provocado uma dificuldade para encontrar profissionais médicos neste momento da pandemia. Na primeira onda, houve uma contratação enorme, quando os números da pandemia começaram a diminuir, os profissionais acabaram sendo desligados e o Governo do Estado agora enfrenta dificuldade para contratar novos médicos.
“Certa vez fui realizar uma ultrassonografia em uma paciente Covid-19 positiva, que estava grávida, prestes a ser intubada. Ela falou que queria ver o filho pela última vez. Mostrei a ela o coração batendo, o neném se movimentando, ela sorriu, e horas depois o bebê acabou falecendo após a sedação. No meio disso tudo, na UTI, equipes foram mobilizadas, toda a maternidade, o obstetra fez uma cesariana de urgência, dentro da própria UTI, mas infelizmente ele não resistiu”, disse Dr Helton Monteiro.
Para ele, esse caso emblemático mostra a realidade de estresse que passam os profissionais de saúde. “A equipe ficou transtornada, muitos choraram, era início do plantão e ele tiveram que continuar. Outros quatro pacientes foram intubados em seguida, ou seja, deram sequência ao plantão com o peso de não ter conseguido salvar uma vida. Infelizmente, foi feita a vontade de Deus. Estamos trabalhando sob uma demanda absurda, com uma carga emocional abalada, cansados física e psicologicamente”, disse.
REGULAÇÃO
Outro problema levantado pelo Sindimed é o protocolo de regulação. De acordo com Dr Helton Monteiro, o paciente perde muito tempo esperando uma transferência da estabilização para a enfermaria ou da enfermaria para um leito de UTI. Segundo ele, o índice de mortes em enfermarias é de quatro a cinco vezes maior que nos leitos de UTI’s privados.
“Existe uma demora muito grande nesse fluxo do paciente ser atendido, chegar uma ambulância do SAMU, ele ser estabilizado e em seguida transferido para uma UTI. Isso às vezes demora dias e nesse intervalo o rim para de funcionar, ele entra com insuficiência renal, precisando de diálise, acaba piorando e pode vir a óbito. Isso tudo as equipes ficam acompanhando, angustiadas, querendo que esse paciente seja atendido da melhor forma possível”, concluiu.
VACINAÇÃO
O Sindimed também apontou problemas na vacinação. A burocratização, segundo a entidade, tem contrariado os profissionais e a falta de planejamento e organização provocado mortes. “Os médicos não pararam, além dos que estão na linha de frente, muitos outros continuaram os atendimentos ambulatoriais, e esses profissionais têm contato com seus pacientes, houve uma lentidão na vacinação desses profissionais, principalmente em Aracaju, porque eles são vetores, atendem idosos, crianças, que muitas vezes são assintomáticas, mas carregam o vírus”, afirmou Dr Helton Monteiro.
“A burocratização também é um empecilho. Chegamos ao momento que para vacinar se exigia um comprovante de pagamento do ISS, que imediatamente fizemos uma denúncia ao Ministério Público e foi retirado. Em outros locais, bastava o profissional mostrar a carteira do Conselho Regional de Medicina (CRM), aqui é essa lentidão, muitas exigências. Um residente que atuava na ala vermelha do Huse, examinando pacientes, intubando, tratando, acabou morrendo porque não foi vacinado”, concluiu.
SES
Procurada para falar sobre o assunto, a Secretaria de Estado da Saúde (SES) disse, em nota, que “a Central de Regulação vem realizando, em média, a transferência de 15 pacientes/dia para um leito de UTI/Covid. A SES destaca ainda que há uma flutuação de vagas de leitos Covid-19 por conta da dinâmica da doença (pacientes que chegam a unidade de saúde e rapidamente agravam com necessidade de UTI e pacientes que se recuperam ampliando, assim, o número de vagas)”.
“O Estado mantém o esforço para ampliação das UTIs e enfermarias, mas vem esbarrando na falta de recursos humanos qualificados para atuar na linha de frente da pandemia. . Este ano de 2021, para enfrentamento de uma nova onda de infectados pelo novo coronavírus, Sergipe abriu, desde o início do mês de março, 57 leitos exclusivos para pacientes com a Covid-19, ampliando para 229 o número de UTI’s, um número recorde de leitos em relação a primeira onda”, finalizou.
SMS
Sobre a vacinação dos profissionais médicos que atuam em consultórios, a Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju (SMS) disse que “o processo de cadastro e de vacinação segue todas as normas de controle preconizadas pelo Ministério da Saúde. A prova da efetividade do processo é que mais de 77% dos profissionais da capital já foram imunizados por meio desse cadastro. Vale lembrar que só Aracaju detém metade de todos os profissionais do estado de Sergipe”.